Tudo o que o empreendedor precisa saber sobre pró-labore e distribuição de lucros
Como todos podem imaginar, empreendedores não vivem de ar ou da pura empolgação em falar “Arriba, Arriba, ai ai!” a cada novo cliente fechado.
A matemática é básica: empreendedor cria empresa -> empresa gera valor para o cliente -> cliente paga empresa -> empresa paga empreendedor.
É muito normal um pequeno empresário ter dúvidas sobre como essa última parte funciona.
Aí fica a pergunta: como o empreendedor recebe dinheiro da própria empresa sem fazer nada errado e sem se afogar em impostos?
São 3 formatos diferentes para o empreendedor ser remunerado pela própria empresa:
1. Pró labore
Pró-labore é um termo latino e significa “pelo trabalho”, portanto, é a remuneração devida ao empreendedor pelo seu trabalho.
O empreendedor que faz jus ao pró-labore é o próprio administrador, conforme definido no contrato social.
Esse administrador pode tanto ser uma pessoa apenas quanto um grupo de gestores chamados sócios.
Embora seja considerado como um salário, a legislação brasileira trata o pró-labore de uma forma diferente, não existindo sobre ele regras obrigatórias relacionadas ao 13º salário, ao FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), às férias.
Sobre ele incidem dois impostos:
- 11% de INSS (valor independente do valor do pró-labore, geralmente fixo, mas que pode aumentar se a empresa adotar o regime tributário de Lucro Real/Lucro Presumido, se o sócio tiver carteira assinada ou caso ele trabalhe em outra empresa como administrador ou mesmo como empregado);
- IRPF (Imposto de Renda de Pessoa Física) de acordo com a mesma tabela que funciona para funcionários de empresas.
Do ponto de vista contábil, o pró-labore é considerado como uma despesa operacional, um dinheiro que é retirado do caixa fora das condições normais.
Por isso, nos livros de registro da empresa, ele deve ser contabilizado como uma despesa administrativa, como Honorários da Diretoria ou Salários da Administração.
2. Distribuição de lucros
Empresas faturam, pagam impostos, contas e, com isso, geram lucro.
Esse lucro pode ser distribuído entre os sócios sem que seja novamente taxado com IRPF, já que empresas pagam IRPJ (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica) sobre o que ganham.
Para que a distribuição de lucros seja feita da maneira certa, existem algumas diretrizes que o Empreendedor precisa tomar:
- Definir no Contrato Social qual a frequência em que os lucros serão distribuídos. Existe um padrão comum para fazer isso anualmente, porém nada (nenhuma lei) impede que seja feito mensalmente, por exemplo.
- Caso a empresa tenha tido prejuízo ao examinar seu passado, ela não pode distribuir lucros. Primeiro ela deve amortizar as dívidas, para depois distribuir lucros (confira, ao final do post, outros detalhes).
- Não é nada saudável distribuir todo o lucro se você já conseguir prever que o mês seguinte será de vacas magras.
3. Juros sobre Capital Próprio
Esse formato é mais usual para empresas com grande capital social.
A ideia aqui é que o sócio receba uma recompensa pelo capital próprio investido.
Como acontece com o pró-labore, essa remuneração é considerada como despesas do ponto de vista contábil, exigindo ao investidor o pagamento do Imposto de Renda retido na fonte sobre o dinheiro que ele recebe.
Considera-se isso positivo para a saúde financeira da empresa.
Como o pagamento é registrado como despesa antes do lucro, não é ela quem paga os tributos, que passam a ser responsabilidade do próprio administrador.
Existem duas taxas para o cálculo desse valor: a TJLP e a Selic.
A TJLP corresponde à Taxa de Juros de Longo Prazo enquanto a Selic é a taxa básica de juros de nossa economia, servindo de referência no mercado brasileiro.
A TJLP é a menor taxa de juros brasileira, seguida imediatamente da Selic.
Dicas de como fazer a distribuição de lucros nas empresas optantes do Simples Nacional
O Simples Nacional é o regime tributário adotado pela maioria das micro e pequenas empresas, pois é bem mais prático para elas e facilita a arrecadação por parte do governo (os impostos devidos são pagos através de um único documento de arrecadação, o DARF).
Veja a seguir alguns exemplos de como a distribuição de lucros é aplicada em empresas do Simples Nacional, considerando atividade/segmento predominante (comércio, serviços, mista).
Empresas que atuam no comércio
Considere que uma empresa automotiva venda peças para automóveis de luxo e tenha um faturamento anual em torno de R$ 200.000,00.
A legislação tributária autoriza uma distribuição de lucros isenta de impostos equivalente a 8% dessa renda, ou seja, um lucro distribuído no valor de R$ 16.000,00.
Empresas prestadoras de serviço
Mantenha o mesmo exemplo acima da citada empresa automotiva.
Nesse caso, sendo ela uma empresa que somente presta serviços, está impossibilitada de vender peças, não é?
Então, digamos que ela oferecer serviços de manutenção, troca e instalação de peças em automóveis de luxo e fature, com essa atividade, o mesmo valor do exemplo anterior: R$ 200.000,00.
O que seus sócios recebem de lucro distribuído é o mesmo? As coisas funcionam do mesmo jeito para empresas comerciais e prestadoras de serviço? Não.
Quando se trata de empresas que prestam serviços, a legislação tributária é ainda mais generosa, permitindo que se faça uma distribuição de lucros isenta de impostos equivalente a 32% da renda.
Logo, o lucro distribuído será de R$ 64.000,00.
Empresas mistas (comercializam e prestam serviços)
Enfim, temos o último caso, aquela em que a empresa tanto vende produtos quanto oferece serviços, caracterizando-se como uma empresa mista.
Vamos aproveitar o mesmo exemplo da empresa automotiva.
Agora sim, ela pode fazer tudo: vender peças para carros luxuosos e também realizar manutenção, troca e instalação de peças.
Será preciso fazer, no balanço financeiro, a separação entre o lucro originado da venda de peças e o lucro que provém da prestação de serviços.
Realizando essa divisão, chegou-se ao seguinte resultado:
- R$ 200.000,00: prestação de serviços;
- R$ 160.000,00: venda de peças.
Quer dizer que sobre o primeiro valor, o total de 32% poderá ser distribuído sem a incidência de impostos (lucro distribuído de R$ 64.000,00) e sobre o outro valor será permitida uma isenção de impostos correspondente a 8% (lucro distribuído de R$ 12.800,00).
Portanto, de um total de faturamento anual de R$ 360.000,00, haverá um valor de lucro distribuído de R$ 76.800,00.
Estratégias para receber um lucro distribuído maior que o permitido pela legislação tributária
Suponha agora que os sócios da empresa automotiva que fatura R$ 200.000,00 com a prestação de serviços desejem receber um pouco mais sobre esse valor.
Eles desejam aumentar seu lucro distribuído para R$ 74.000,00. Isso é possível?
Os sócios deverão provar, através de balanço, que o faturamento foi de R$ 74.000,00 – assim, sobre esse valor não incidirão impostos.
Porém, se eles retirarem os R$ 74.000,00 sem comprovarem esse faturamento, então apenas R$ 64.000,00 serão isentos, mas serão tributados os 10% restantes.
Dicas úteis para lidar com pró-labore e distribuição de lucros
a) Se a sua empresa gera lucro, remunere os sócios o máximo possível por distribuição de lucros.
Isso porque o valor passado ao empreendedor em distribuição de lucros é limpo, já que no pró-labore incidem IRPF e INSS.
A lei isenta o regime de distribuição de lucros desses impostos, o que não acontece com o pró-labore.
Contudo, a lei (artigo 77 da Instrução Normativa INSS 100/2003) determina que haverá tributação previdenciária sobre valores que ultrapassarem o lucro apurado nos balanços.
Portanto, toda empresa deve se precaver e deixar claro no contrato social que irá apurar a demonstração de resultado mensalmente, de 3 em 3 meses ou em períodos inferiores a 1 ano).
Os balanços e sua demonstração de resultado devem ser registrados no Livro Diário, comprovando dessa forma a existência dos lucros distribuídos.
Para entender melhor, nada melhor que os exemplos. Considere esse, retirado do Portal de Auditoria:
Uma empresa teve rendimento mensal de R$ 6.000,00 em 2005.
A tributação mensal é a seguinte:
- Pró-Labore:
INSS 20% = R$ 1.200,00
IRF (tabela 2005*) = R$ 1.184,65
TOTAL = R$ 2.384,65
* cálculo sem considerar dependentes e outras deduções permissíveis.
- Distribuição de lucros (contábeis):
INSS = Zero
IRF = Zero (art. 10 da Lei nº 9.249/95, desde que apurados a partir do mês de janeiro/1996)
TOTAL = Zero
Assim, a economia tributária, em 2005, pôde chegar a R$ 2.384,65 x 12 = R$ 28.615,80.
b) O pró-labore não é obrigatório e não existe um valor mínimo para ele.
Tudo que se refere ao pró-labore deve estar estabelecido no Contrato Social.
Uma boa saída para não ter isso escrito em pedra é utilizar no Contrato Social: “valores e periodicidade de pró-labore serão definidos pelos sócios”.
Alguns empreendedores utilizam a tabela do INSS, que estabelece teto mínimo e teto máximo para arrecadação.
O pró-labore nunca pode ser inferior ao salário dos funcionários, pois se não despertará suspeitas de sonegação fiscal.
Esse valor deve estar, contudo, dentro dos limites financeiros da empresa, para evitar prejuízos.
É muito comum sócios não tirarem pró-labore e terem um contrato de trabalho que paga um salário mínimo ao mês (em alguns casos vemos contratos de R$1/ano).
c) Os benefícios trabalhistas sobre o pró-labore são opcionais.
Como foi dito acima, a lei trata o pró-labore de forma diferenciada em relação ao salário tradicional.
Por essa razão, benefícios trabalhistas são opcionais e não obrigatórios.
A definição desses benefícios (FGTS, 13º, férias) deve ser feita através de um acordo formal entre o administrador e a empresa.
O acordo pode definir, por exemplo, que se recebam as férias, mas não o 13º salário.
d) A distribuição de lucros não precisa ocorrer apenas anualmente e proporcional ao capital social
Desde que esteja colocado no Contrato Social qual a frequência, a distribuição de lucros (desde que haja lucro) pode ocorrer, por exemplo, mensalmente.
Além disso, os sócios podem definir que a distribuição de lucros não precisa ser diretamente proporcional ao capital social de cada um deles.
Ou seja, um sócio pode receber a mais por um critério a ser definido, por exemplo, desempenho ou vendas realizadas.
e) Como o empreendedor declara esses diferentes ganhos em sua declaração de imposto de renda de pessoa física?
O formulário de declaração de IRPF contém campos específicos para cada uma das 3 formas de recebimento. Por isso, procure sempre o campo exato.
Além disso, vale sempre a pena lembrar que uma boa ferramenta de gestão financeira pode facilitar muito o seu dia-a-dia.
f) Empresas em débito com INSS ou com o governo não podem conceder remuneração aos sócios
É isso mesmo! Caso sua empresa esteja devendo à Seguridade Social ou esteja em atraso com o pagamento de impostos (tributação fiscal), fica proibida de conceder dividendos aos sócios. Confira a seguir as leis e o regulamento que tratam do assunto:
- Artigo 52 da Lei nº 8.212/91: “À empresa em débito para com a Seguridade Social é proibido:
I – distribuir bonificação ou dividendo a acionista;
II – dar ou atribuir cota ou participação nos lucros a sócio-cotista, diretor ou outro membro de órgão dirigente, fiscal ou consultivo, ainda que a título de adiantamento.”
- Artigo 889 do Regulamento do IR/99: “As pessoas jurídicas, enquanto estiverem em débito, não garantido, por falta de recolhimento de imposto no prazo legal, não poderão (Lei nº 4.357, de 1964, artigo 32):
I – distribuir quaisquer bonificações a seus acionistas;
II – dar ou atribuir participação de lucros a seus sócios ou quotistas, bem como a seus diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos.”
- Por fim, o artigo 17 da Lei nº 11.051/2004 define a quem e como a penalidade (multa) será aplicada no caso de as empresas desrespeitarem o que foi determinado:
I – às pessoas jurídicas que distribuírem ou pagarem bonificações ou remunerações, em montante igual a 50% das quantias distribuídas ou pagas indevidamente;
II – aos diretores e demais membros da administração superior que receberem as importâncias indevidas, em montante igual a 50% dessas importâncias.
Tal multa fica limitada a 50% do valor total do débito não garantido da pessoa jurídica.
Por isso, fica claro que não compensam as sonegações. Lembre que dívidas implicam na perda de direitos e regalias ou acabam gerando mais dívidas.
Como acontece a distribuição de lucros em sua empresa? Ela é optante de qual regime tributário?
Qual a forma de remuneração para os sócios: pró-labore, distribuição de lucros, juros sobre capital próprio?
Todos estão satisfeitos com sua remuneração? A empresa está se beneficiando com isso?
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